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IPVA – TRIBUTAÇÃO OCULTA NA IMPOSIÇÃO DE ACESSO À INTERNET

IPVA – TRIBUTAÇÃO OCULTA NA IMPOSIÇÃO DE ACESSO À INTERNET

ADRIANO PINTO.

PROFESSOR APOSENTADO DA FACULDADE DE DIREITO/UFC.

MEMBRO DO INSTITUTO DOS ADVOGADOS DO CEARÁ.

MEMBRO DO INSTITUTO CEARENSE DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS.

1.- Como divulgado no Diário do Nordeste de 2/01/2018, o pagamento do IPVA

somente poderá ser feito mediante acesso à site da Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará( SEFAZ), para a emissão de boleto, eis que, como ocorrido no ano passado, eles não serão remetidos ao contribuinte.

O contribuinte deverá imprimir os boletos gerados em ambiente da Internet e providenciar o pagamento nas agências bancárias autorizadas. Sabe-se que o propósito desse procedimento é poupar gastos de papel e da remessa postal, mas ele transfere para o contribuinte custos operacionais que devem ser da Administração Fiscal, produzindo, pois, uma tributação oculta que se agrega ao valor nominado para o IPVA.

2.- Ensina HUGO DE BRITO MACHADO quanto ao objetivo dos tributos:

“Assim, quanto a seu objetivo, o tributo é: a) Fiscal, quando seu principal objetivo é a arrecadação de recursos financeiros para o Estado. b) Extrafiscal, quando seu objetivo principal é a interferência no domínio econômico, buscando um efeito diverso da simples arrecadação de recursos financeiros. c) Parafiscal, quando o seu objetivo é a arrecadação de recursos para o custeio de atividades que, em princípio, não integram funções próprias do Estado, mas este as desenvolve através de entidades específicas.”. (Curso de Direito Tributário. Ed. Malheiros, São Paulo: 2004, p. 75). No entanto, HUGO MACHADO (Curso de Direito Tributário. Ed. Malheiros, São Paulo: 2004, p.75) afirma que existiram, ainda, outros tipos de tributo, que não se enquadrariam nos conceitos já mencionados, como, por exemplo, o denominado TRIBUTO OCULTO OU DISFARÇADO.

“Chega-se a esse conceito por exclusão. A prestação pecuniária compulsória que não constitui sanção de ato ilícito e que é instituída e cobrada sem obediência aos padrões que o ordenamento jurídico estabelece para a instituição e cobrança dos tributos pode ser considerada um tributo oculto.”

“Para instituir e cobrar tributo oculto ou disfarçado o Estado se vale de sua soberania, impõe a prestação fazendo-a compulsória por via oblíqua.” (MACHADO, Hugo de Brito, Curso de Direito Tributário. Ed. Malheiros, São Paulo: 2004, p.75).

Por certo, essa prestação compulsória instituída em via obliqua, se revela nas transferências de custos operacionais que o aparato fiscal deveria suportar para arrecadar o tributo, projetando uma carga financeira para o contribuinte MAIOR do que aquela fixada para o tributo nominado.

3.- Em um Estado Democrático de Direito, o Estado deve exercer sua competência impositiva, nos limites delineados como revelador da capacidade tributária, sem estabelecer ônus ocultos através de procedimentos de arrecadação, porque, nesse caso, também se revela UM DESVIO DE FINALIDADE.

Toda e qualquer imposição feita no exercício da competência tributária, deve ser conciliada com a Constituição Federal que, ao mesmo tempo em que concede o poder de tributar, o limita e o condiciona.

Onde e quando se tenha no procedimento de arrecadação tributária a imposição de condutas que impliquem em agregar ônus financeiros ou substituir aqueles que são pertinentes à atividade administrativa arrecadadora, agrava-se a carga tributária de forma oculta, disfarçada.

O procedimento administrativo de arrecadação tributária é lícito e legítimo, contudo, não pode ser uma forma de TRANSFERIR PARA O CONTRIBUINTES OS CUSTOS OPERACIONAIS da Administração Fiscal.

Embora seja legítimo que a Administração Fazendária organize suas atividades para buscar a economia de gastos, estes NÃO PODEM SER TRANSFERIDOS PARA O CONTRIBUINTE, até porque, nesse caso, além do DESVIO DE FINALIDADE DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, HAVERÁ O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA, O ABUSO NO EXERCÍCIO DE DIREITO.

O abuso de direito encontra-se previsto no artigo 187 do Código Civil: “Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”.

Em especial, opera-se, também, a quebra da boa-fé do gestor fazendário, que por sua vez, nos leva à questão da ETICIDADE no trato e na interpretação do ordenamento jurídico como pauta valorativa de qualquer atuação social.

Sob os valores e princípios que regem a Administração Pública e, em especial, a Gestão Fazendária, o exercício de qualquer direito deve obedecer a, pelo menos, UM MÍNIMO DE CONTEÚDO ÉTICO, não podendo o titular do direito dele fazer o uso sem que haja uma real e justificável finalidade.

Não basta ao titular de uma competência impositiva fazer um mero uso de um direito existente, mas cumpre-lhe fazê-lo com responsabilidade e boa-fé, não só para com o contribuinte, mas para com toda a coletividade, que, em última análise, é a destinatária da gestão fazendária.

4.- Não há dúvidas de que a Constituição Federal também prescreve o dever ético-jurídico ao exercício da competência impositiva sem desvios de finalidade, sem procedimento que transfira para o contribuinte os custos operacionais da arrecadação tributária, sem o que o tributo não será o instrumento financeiro indispensável à realização da justiça tributária e, por conseguinte, justiça social.

Em uma gestão fiscal democrática, os procedimentos de arrecadação devem ser pautados pela eticidade, que se abriga na moralidade administrativa, na repulsa ao enriquecimento sem causa legitima.

Não se pode admitir que o Estado, enquanto instituidor e gestor dos tributos, permita praticas abusivas, que fraudam os princípios e valores que a Constituição proclama para a Administração Pública em geral, e, em especial para a gestão tributária.

A competência tributária não deve ser instrumento de CONFISCO através da imposição de gastos pertinentes à arrecadação do valor nominal do tributo, que se coloca como ônus do contribuinte sem a formatação de um dos fatos geradores explicitados na Constituição Federal.

Ao cidadão-contribuinte, dentro desse contexto, e considerando também o princípio da capacidade contributiva, não pode a Administração Tributária onerar com custos financeiros da atividade arrecadatória, que se faz estranha e além da expressão identificadora do fato gerador do IPVA.

Ademais, o Estado deve privar pela segurança jurídica, e abster-se de tributar de maneira DESIGUAL, sendo certo que, no caso em pauta, muitos são os contribuintes que ainda terão custos adicionais para contratar quem tenha aptidão e desempenho na utilização da Internet.

5.- A Constituição da República, como lei fundamental, nos apresenta uma série de princípios, que deverão ser observados tanto na elaboração de normas impositivas, quanto na execução das mesmas.

Os princípios são dirigidos aos legisladores, juízes, enquanto aplicadores da lei, quando se fizer necessário julgar se dado instrumento legislativo está condizente com o que determina o princípio, como também pelo Poder Executivo ao dar cumprimento ao que a lei determina, especialmente, no momento de exigir os tributos dos contribuintes.

A ruptura de um principio traduz em consequências mais graves do que a violação de uma simples norma, visto que ofende uma regra fundamental informadora de todo um sistema jurídico.

A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 3º, afirma que é objetivo da nação constituir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e promover o bem estar de todos.

Essa proclamação do artigo 3º da Constituição da República também ampara o contribuinte contra os procedimentos de arrecadação tributária, que transfiram os ônus financeiros que são próprios dessa atividade administrativa.

A busca por uma sociedade livre, justa e solidária sob a ótica da tributação, intenta concretizar o princípio ETICIDADE FISCAL e da CAPACIDADE CONTRIBUTIVA, dentre outros.

6.- Em face do princípio da Capacidade Contributiva na Constituição de 1988, a escolha de uma determinada opção de procedimento fiscal deve respeitar a capacidade contributiva expressa no enunciado do fato gerador do tributo.

Não é dado ao Fisco, sob a alegação de efetuar economia de gastos operacionais, ao se desincumbir de encargos arrecadatórios, transferir para o contribuinte custos financeiros estranhos nominação do fato gerador tributário que identifica a capacidade contributiva.

A CF/88 traz a capacidade contributiva como princípio informador do sistema tributário. É diretriz positiva que estrutura o ordenamento tributário, que deve ser observado sob pena da norma infraconstitucional ser considerada inconstitucional.

Diz o artigo 145, § 1º da Constituição Federal que sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

Pode-se constatar que o princípio da capacidade contributiva tem por objetivo impedir que sejam instituídas imposições excessivas, que tenham caráter confiscatório. Bem como veda a tributação oculta, aquela que não se expressa em fatos-geradores especificados na Constituição, ao repartir o poder impositivo nas competências instituidoras de tributos.

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